terça-feira, 6 de maio de 2014

Ultra Trail de Sesimbra 3 de Maio 2014

O Ultra Trail de Sesimbra realizado no dia 3 de Maio fazia parte activa da minha aproximação aos 100 kms de Portalegre a realizar dia 17 de Maio próximo, fazia e fez, embora tivesse de lá saído bastante maltratado devido ao excessivo calor e provavelmente mal equipado no que diz respeito ao calçado. Tiramos sempre bastantes ensinamentos em provas deste tipo para enfrentar distâncias superiores, é o caso, mas ficamos também com muitas dúvidas quando nos surge algo inesperado quando temos tão pouco tempo de intervalo e tentar ainda corrigir o que está mal...
O local onde funcionou o Secretariado este ano foi mudado, esse facto atormentou-me a mim e a muitos dos participantes, nem se pode dizer que cheguei tarde (7,15h) mas só ás 7,55h é que consegui obter o dorsal, ainda lá ficaram muitos atletas à espera de também receberem os seus, dali até ao local da concentração foi uma correria para chegar a tempo da ordem de partida, felizmente o Director da prova estava informado e atrasou ligeiramente a saída dos atletas. Claro que a responsabilidade cabe-me por inteiro, o problema é que conheço mal Sesimbra e em consequência o nome e localização dos hotéis, mas há hora de partir ás 8 e picos estava já serenado e mais calmo, pensando apenas no que me esperava e como me iria sair de mais este empeno.
Nesta prova de Ultra tinha ainda presente o meu colega de Clube, o Rui Pacheco e o meu genro e colega de equipa Daniel Pinto que iria fazer a prova da mini de 21 kms???, foi também de grande importância no apoio ali nos momentos que antecederam a partida uma vez que sua prova era só ás 9,30h.
A organização já tinha alertado para o calor que iria estar durante todo o dia, e quando partimos os sinais do tempo quente já davam o alerta para o que aí vinha, por isso vesti uma t,shirt técnica de manga comprida para evitar as queimaduras nos braços que estavam mais expostos ao sol. 
Era a 3ª vez que ia fazer esta prova, sempre no mesmo sentido, dura mas sempre muito bonita, nem sequer me surpreendi quando verifiquei que tinham feito alterações ao percurso, pelo menos mais duas incursões arribas abaixo e acima, espectacular a 1ª mas muito perigosa a 2ª, nesta andei ao bate cu por ali abaixo já que a corda ao longo do muro apenas existia no alto e depois nada havia para nos segurar, a solução que encontrei foi passar para o lado direito do muro e aí encontrar mais consistência no chão e alguns arbustos onde se podia agarrar, assinale-se contudo que nunca estivemos em risco de algum acidente motivado pela perigosidade da descida, aliás a organização não se cansou de prevenir para os cuidados a ter naquele local, apesar da queda que ali dei e ter esfarrapado os joelhos no muro ainda me pergunto o que está ali a fazer aquele mamarracho de muro em cimento que corta a arriba de alto abaixo quando no seu interior apenas existe vegetação tal como a que existe do lado de fora, pode ser que alguém ainda me responda!
A partir dali nada se alterou em termos de percurso, com o sol a aumentar de intensidade tornava-se penoso avançar, as arribas e o arvoredo muito curto não deixavam trespassar pontinha de vento, nem o facto de andarmos 30 kms perto do mar nos trouxe qualquer melhoria em termos de frescura, levava também um boné com abas caídas atrás como protecção ao pescoço e a humidade crida pelo suor na t,shirt ajudava a manter o corpo um pouco mais fresco. Quando atingi o abastecimento junto do Farol já só tinha em pensamento as dunas que se aproximavam, elas estavam entre os kms 25 a 30, ainda me restava a esperança de fazermos aquele trajecto pela praia do Meco tal como o tínhamos feito há 2 anos, mas não, o caminho apontou-nos de novo para as dunas, o sol já estava quase a pico e com 5 horas de prova, mais abaixo víamos em quase toda a praia os banhistas a banhos de sol, sim porque podiam-se contar pelos dedos de uma mão aqueles que estavam dentro de água, para nós que nas dunas torrávamos ao sol a única coisa que queríamos era aquele fresco da água do mar, tal era o escaldão que já suportávamos. Um pouco mais à frente terminam as dunas e dá-se inicio à descida que conduz aos bares de apoio de praia, um pouco antes encontro um pequeno ribeiro que desagua para a praia e que vem do interior, refresco-me num local mais fundo e encontro um atleta sentado na berma do riacho com as pernas dentro de água e cheio de dores devido a câimbras na coxa, com ele estava o Pedro (o mesmo que tocava o Bandolim na Corrida do 1º de Maio) aproximei-me e enfiei-me dentro de água para o ajudar, nem pensei que ainda tinha os pés e sapatos cheios de areia das dunas, depois de comprimir a parte muscular ele sentiu-se melhor e seguiram os 2 pouco depois atrás de mim. O abastecimento dos 30 kms estava logo ali a seguir e creio que o rapaz acabou por desistir logo ali, se assim não foi que me desculpe pois ele estava muito queixoso e ainda faltavam mais de 20 kms para o fim.
Aproveitei para beber água e abastecer o camalbek e comer um pouco de laranja, havia por ali mais coisas para comer mas com o calor que estava nem a marmelada caía bem, tirei a areia dos sapatos e das meias mas como estavam molhados, meias e sapatos, muita areia ainda lá ficou o que se tornaria um calvário para mim a partir daquele momento. Agora percorríamos estradões e trilhos onde já se podia correr, mas as tareias das arribas e das dunas deixaram muita mossa, a agravar tudo isso a planta dos meus pés começam a ceder, a fricção é permanente as areias, as meias molhadas e o chão muito quente vão enrugando e branqueando provocando fortes dores assim que cada vez colocava os pés no chão, tentava ignorar as dores e seguia correndo sempre que o terreno era mais propício. Para piorar as coisas volto a encontrar um ribeiro em plena estrada, não havendo alternativa volto a molhar os pés e tudo piorou. Agora quase que só ando, pelas minhas contas estava quase a chegar ao km 37 onde estava novo abastecimento, o meu ritmo anda perto dos 5 kms por hora, assim sei que chegarei à meta dentro das 10h de prova. No sentido em que vinha nem me apercebia que o abastecimento estava ali, um barracão, eu ouvia pessoas e até pensei que era alguma festa, vejo uns pinos no chão e pensei até que se tratava de alguma prova de kart, olho e só tenho a certeza porque estavam lá alguns trailistas sentados e a comer. Um pouco antes de ali chegar numa das muitas vivendas que ladeavam as estradas pedi uma pouca de água a um senhor que estava no seu varandim a enviar-nos palavras de incentivo, parei agradeci e pedi a água, ali estava uma mangueira no chão e eu só queria uma pouca de água mais fresca pois a que transportava estava muito quente e só bebia o suficiente para bochechar a boca uma vez que o organismo já não tolerava sequer a água. O Senhor foi a casa e trouxe-me uma garrafa de 1,5l de água muito fresquinha que foi um encanto, parece que ganhei outra vida, despedi-me dele e da sua Senhora e abalei com outro ânimo à procura do abastecimento e posto de controlo dos 37 kms. Aqui ainda comi uma canja e arrependi-me depois de não repetir, a Ana Ciríaco ainda insistiu mas eu não comi, ali já levava mais de 8 h. de prova e ainda faltavam 15kms para percorrer. Parti de novo e pouco depois chegam mais alguns atletas, aproveito e vou com eles, ao longo da prova andei sempre com companhia por perto, nem sempre isso acontece e nesta parte final foi bom ter a companhia de alguém, no caso 3 amigos que partiram juntos e juntos queriam chegar, até que um deles começou a sentir-se indisposto e foi a altura de eu abalar percorrendo agora uns trilhos muito pedregosos e depois a descida para as pedreiras. Devido ao estado lastimoso dos pés procuro ainda assim descer a serra a correr, ao fundo já via novo abastecimento e malta amiga a incentivar, queria água fresca mas só havia água quente, a desidratação era agora mais evidente, a boca secava a cada 100 metros e não tinha sede, havia uns pedaços de laranja e umas batatas fritas mas não lhes toquei, preferi aguardar pelo abastecimento do Castelo pois lá havia mais variedade e podia ser que conseguisse comer alguma coisa. Já tinha recebido alguns telefonemas a saber por onde andava, é sempre bom a gente sentir que nos esperam e ás vezes no meio do nada sempre aparece esta mão amiga a dar-nos o alento final. Aos 49 kms chego ao Castelo, lá está o Ricardo e o Ico, ajudam-me a abastecer de água e tratam de tudo, grandes amigos que nesta hora eles bem percebem daquilo que precisamos, nem lhes vou agradecer porque sei que a sua satisfação maior foi ter ali chegado e prosseguir até lá abaixo bem juntinho ao mar. Na meta tive a grata satisfação de ver a minha filha Susana, foi surpresa para mim, mas ali estava, olhei para os lados a ver se via o pirralhito David mas nada, corto a meta e logo sou abraçado pelo Tigre a felicitar-me por conseguir fazer a prova e chegar ali, muitos amigos de todo o lado apareciam com os mesmo intuitos, aparece também o Davidezinho e começo a ficar um pouco atarantado até que me dizem para seguir e ir até ao abastecimento. Valeu-me aqui a pouca vontade de comer alguma coisa e ingerir alguns líquidos porque quando cheguei ao local de abastecimento fiquei desolado com o que vi, tinha de saltar para o areal onde estavam os géneros e líquidos, o sol batia ali com muita intensidade e nem uma sombra existia para me refugiar um pouco, praguejei sem ofender, e pedi desculpa porque de sol já eu estava farto durante todo o dia e vim embora. Depois foi o banho mesmo ali no apoio de praia, as dores eram mais que muitas nos pés, estava com força e as pernas nada de mal assinalavam, por isso eu estranhar porque é que os pés reagiram tão negativamente, teria sido só pelo facto de molhar duas vezes os pés e a acumulação de areia ao mesmo tempo provocando a fricção dando origem ao aparecimento das verrugas e bolhas? ou seria o calçado que não é apropriado para aquele piso? O que sei é que é uma incógnita e me coloca desde já em alerta para S. Mamede a apenas 11 dias de distância.
Os dados desta minha prova foram os seguintes: 51,830 kms de prova, 10,56h. para terminar, ritmo médio12,40m por km, gastos 3.214 calorias, ganho de elevação 1.599m.
Dia 10/5 à noite vêm aí os trilhos das Lampas para depois tranquilamente pensar só na Ultra de S. Mamede no dia 17 de Maio. 
    

5 comentários:

Jorge Branco disse...

Mas um relato absolutamente magistral de um enorme atleta! Nem sei o que dizer! Vou dar o devido destaque lá no UK,
Forte abraço campeão!

Rui Soeiro disse...

Caro Joaquim muitos parabéns por mais um excelente relato! Comecei a seguir o seu blog muito recentemente quando me comecei a dedicar mais ao trail. Por coincidência também esteve nas últimas 2 provas em que participei, Almourol e Sesimbra.
Muita força e que em Portalegre tenha uma grande prova!
Abraço.

Alexandre Duarte disse...

Parabéns Joaquim, pela prova e pela descrição, que nos deixa pregados no monitor. Este ano não pude participar numa das provas que mais gosto, mas participei em 2013 e experimentei idênticas dificuldades às que descreveste, embora não tenha aguentado até ao final como tu. Abraço e até sexta.

Sílvio Horta disse...

Camarada Joaquim fico muito contente por ter terminado mais uma Ultra, ainda para mais um desafio duríssimo com o calor abrasador e tantos kms em areia. Um abraço

Unknown disse...

Desde já gostaria de dar os parabéns por ter terminado mais uma dura prova.
Eu também participei e tive a mesma sensação.
Talvez devido ao calor, ou talvez de ter visto os banhistas na praia a descansar ;-) aqueles 5/6 Km das dunas levaram-me boa parte das energias…
Tenho apenas a acrescentar que como aspectos negativos, tenho a apontar a recepção na meta, sem fotos e sem a entrega do prémio finisher, que só vim a saber que existia no dia seguinte e que para o obter tive de o ir buscar… e o tal ultimo abastecimento que estava ao “lume”. De resto 5*.
Espero S.Mamede tenha sido um sucesso! (empeno) sem mazelas!